O planejamento das refeições ganhou maior atenção durante a pandemia da covid-19. Com o distanciamento social, as comidas tiveram de ser feitas dentro de casa por um longo período, o que levou muita gente a aprender a cozinhar.
Experiências culinárias foram apontadas como capazes de reduzir o estresse durante a crise sanitária.
Ensaio clínico realizado de março a abril de 2020 colheu evidências de que ensinar habilidades gastronômicas para preparar receitas saudáveis, mesmo que à distância, promove o autocuidado e a resiliência.
Montar um cardápio semanal e ser o próprio chef podem trazer benefícios ainda maiores. Além de agregar nutrientes ao prato, o planejamento traz economia nas compras e evita o desperdício de alimentos.
O Guia de Preparação de Refeições da Universidade de Harvard, nos Estados Unidos, também lista como vantagens a economia de tempo e a redução do estresse, “evitando decisões de última hora sobre o que comer ou uma preparação apressada”.
Levantamento realizado na França concluiu que o planejamento alimentar foi associado a uma dieta mais saudável, com maior variedade de alimentos.
“O planejamento das refeições pode ser potencialmente relevante para a prevenção da obesidade”, reforçam os pesquisadores.
Como montar um cardápio com alimentação saudável?
O Guia Alimentar para a População Brasileira recomenda que os alimentos in natura ou minimamente processados sejam a base da alimentação.
A partir dos hábitos de consumo dos brasileiros, a publicação traz exemplos de conjuntos de alimentos para as três refeições principais, que juntas podem fornecer cerca de 90% do total de calorias consumidas ao longo do dia.
Para criar um cardápio semanal, contudo, é muito importante considerar fatores como rotina, objetivos e aspectos individuais relacionados à saciedade. Segundo a nutricionista Jacqueline Wahrhaftig, do Time de Saúde da Alice, não há um número fixo de refeições que um adulto deve fazer por dia.
“Há pessoas que sentem mais fome ao longo do dia e se adaptam melhor à inclusão de lanches intermediários. Outras preferem consumir apenas as refeições principais. Desde que as necessidades nutricionais sejam atendidas, e que as sensações de fome e de saciedade sejam respeitadas, pode-se adaptar o plano ao perfil individual”, afirma.
Para um café da manhã equilibrado, a sugestão é combinar alimentos que sejam fontes de energia (como cereais, pão integral, aveia, tapioca ou cuscuz) com proteínas (como ovos, leite, queijos, homus, pasta de amendoim, entre outros).
As frutas também não podem faltar no início do dia, porque são alimentos reguladores. “Aqui vale também a dica de preferir alimentos naturais e íntegros, seguindo a regrinha de ouro de descascar mais e desembalar menos”, lembra a nutricionista.
Almoço nutritivo e alimentos saudáveis para o jantar
Um prato de almoço equilibrado deve ser composto de 50% de verduras e legumes. “Podem ser crus, cozidos, refogados, assados... O importante é ter uma variedade de cores. Quanto mais colorido, melhor!”, orienta Jacqueline Wahrhaftig.
A outra metade deve ser dividida entre os cereais e tubérculos (25%), como arroz, quinoa, milho, macarrão, batata, mandioca e mandioquinha, e os alimentos fontes de proteína (25%), tanto de origem animal (carnes, peixe, frango, aves ou ovo) quanto vegetal (feijão, lentilha, grão de bico, ervilha ou soja).
Para complementar a refeição, é recomendado incluir gorduras boas, como o azeite de oliva para temperar, ou sementes de abóbora e girassol na salada.
As frutas são opções saudáveis de sobremesa, sendo que as cítricas ajudam a absorver o ferro da refeição.
A mesma proporção de alimentos é indicada para o prato de jantar.
A janta pode ser substituída por lanche?
É muito comum ter menos disponibilidade de tempo para preparar um jantar diariamente ou até haver preferência por lanche à noite. A refeição noturna, contudo, deve ser pensada para manter a qualidade nutricional.
“O principal cuidado é combinar os alimentos de forma a fazer um lanche completo e não cair em refeições desbalanceadas, com ausência, por exemplo, de legumes e verduras, e exagero nos acompanhamentos, como embutidos e queijos gordurosos”, afirma Jacqueline.
Para um lanche equilibrado no jantar, podem ser escolhidos alimentos que são fonte de energia (como pão sírio, pão de forma ou wrap) e recheá-los com opções proteicas (como pastinhas de frango ou atum, cottage, queijo minas, homus, entre outros).
O recheio pode ganhar mais nutrientes com a inclusão de legumes e hortaliças, tais quais cenoura ralada, rúcula, tomate ou abobrinha grelhada.
Para reduzir a quantidade de sódio, a dica é evitar temperos prontos e optar pelos naturais (alho, cebola, páprica, pimenta, açafrão, entre outros).
“Além disso, é necessário cuidado com a quantidade de óleo ou manteiga que será utilizada para refogar os alimentos. Sobre o modo de preparo, evite colocar o alimento em submersão em óleo. Troque por preparações assadas, cozidas ou grelhadas”, recomenda a nutricionista.
Outras refeições durante o dia
Algumas pessoas podem sentir necessidade, ao longo do dia, de fazer pequenas refeições em complementação aos pratos principais. A orientação, nesses casos, é também privilegiar alimentos in natura ou minimamente processados, limitar os processados e evitar os ultraprocessados.
Frutas frescas ou secas são excelentes alternativas, assim como leite, iogurte natural, castanhas ou nozes. Esses alimentos têm alto teor de nutrientes e grande poder de saciedade, além de serem práticos para transportar e consumir.
As exceções podem compor o cardápio da semana?
Na elaboração do plano alimentar, as exceções também devem ser consideradas. “Comer tem seu papel social e de prazer na nossa vida. O que precisamos é planejar e organizar essas exceções para que não vire a regra”, reforça a nutricionista Rafaela Schmidt, também do Time de Saúde da Alice.
Ela acrescenta que ‘as escapadas da dieta’, que podem ocorrer em ocasiões especiais ou quando bate ‘aquela vontade’ de comer uma iguaria preferida, pressupõem moderação.
“Se você gosta de bolo, por exemplo, escolha um local de que goste e vá até lá para comer. Evite comprar em grandes quantidades e trazer para casa, pois a chance de abusar será maior”, exemplifica.
A nutricionista, ao criar planos alimentares para os membros da Alice, costuma deixar pelo menos duas refeições livres por semana para que possam comer o que têm vontade, mas sem exagerar. “O ideal é que não seja no mesmo dia, assim evitamos a sensação de estufamento e o pensamento de que só se pode comer naquele único dia”.
O passo a passo para colocar o plano alimentar em prática
Para a montagem do cardápio semanal, o Instituto de Saúde Pública ligado à Universidade de Washington, nos EUA, sugere estratégias como fazer um brainstorming de possíveis receitas, envolvendo toda a família.
Outra dica é considerar os produtos que estão em maior oferta no momento, levando em conta, por exemplo, a sazonalidade de frutas, legumes e verduras.
Planilhas em papel, sites ou aplicativos podem ajudar a distribuir os pratos. Deve-se observar a disponibilidade de tempo para prepará-los, considerando os dias com maior quantidade de tarefas.
Definidas as refeições que irão compor o cardápio da semana, o próximo passo é fazer a lista de compras. Alguns ajustes no plano provavelmente ocorrerão neste momento, de modo a aproveitar cada alimento em sua integralidade e evitar desperdícios.
De acordo com o Programa Mundial de Alimentos, a cada ano, a quantidade de alimentos perdidos ou desperdiçados equivale a uma perda financeira de cerca de um trilhão de dólares. No Brasil, o montante de alimentos desperdiçados diariamente chega a 41 mil toneladas.
O planejamento alimentar, nesse contexto, é visto como medida eficaz para evitar a perda de comestíveis em casa.
Quando estiver no mercado ou hortifruti, a dica para não ‘cair em tentação’ ao deparar com produtos não-saudáveis é ir ao local após ter feito uma refeição.
A ausência de fome diminui os impulsos para consumir salgados, doces ou outros produtos de pouco valor nutricional.
O próximo passo é encaixar na rotina o tempo de preparo das refeições. Recomenda-se escolher um dia para higienizar frutas e hortaliças, pré-cozinhar alguns alimentos e preparar congelados.
“Os legumes e verduras podem ser guardados higienizados na geladeira para facilitar o preparo. Outra sugestão seria cozinhar um frango desfiado e deixar congelado para virar um escondidinho ou um recheio de uma torta para a semana. Os vegetarianos podem congelar feijão ou grão de bico”, ressalta a nutricionista Rafaela Schmidt.
Vale lembrar que se o seu objetivo, ao fazer o planejamento de refeições, é também emagrecer ou adequar o cardápio para o tratamento de doenças crônicas como hipertensão ou diabetes, o melhor é contar com as orientações de um nutricionista ou de seu Time de Saúde.
“O planejamento alimentar elaborado por um nutricionista conterá alimentos, pensando nos seus objetivos principais. O profissional trará opções para que se possa variar o cardápio e não se sentir que está em dieta”, finaliza Rafaela.